Estou profundamente mexida com a indicação de Ainda Estou Aqui aos três Oscars. O simbolismo disso é de ressurreição.
Por quase dois anos passei diariamente em frente à Cinemateca Brasileira de portas fechadas pelo governo Bolsonaro. Diariamente sentia o luto de ver seres de alma miserável destruírem tudo o que faz a gente se distanciar das trevas. O ódio dessa gente pelo bom e belo levou os sensíveis a um estado de enfermidade psíquica.
Por essas razões da vida, em 8 de janeiro de 2022 eu estava no Rio de Janeiro, exatamente em frente de onde era a casa dos Paiva, em Ipanema. No calçadão, li sobre a invasão à Praça dos Três Poderes.
Eu olhava em volta e nada tinha mudado. Ninguém se abalou, a praia continuava igual. Decidi caminhar até a padaria Rio Lisboa, no Leblon, para ver a movimentação. Ali só se falava disso. Mas eu não tinha muito o que fazer.
Pensei em quanto eu era um grão de areia. Se o golpe vingasse, o que eu faria? Se os tanques fossem às ruas? Me senti ninguém ali.
No entanto, fiquei paradoxalmente muito feliz pelo ataque. Tinha certeza que a partir dali essa página seria encerrada. E está sendo. Era o expurgo. Era a chance de curar o passado e o governo fez a lição casa.
Já o Walter Salles é alguém. E ele conseguiu, com inspiração, consciência, dinheiro e influência, ser a antítese da miséria da alma que nos assola. Quando vi aquele filme, pensei ser a primeira vez em anos que eu via um filme de verdade. Como obra, é um primor. Como cicatrização da ferida da alma coletiva, está sendo nosso grande bálsamo.
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